Quadrinho traz crônicas de fotojornalista brasileiro durante a Ditadura Militar

Nesta sexta-feira, dia 17/06, será lançada a edição encadernada do quadrinho nacional Ditadura No Ar – Coração Selvagem (Editora Draco), durante a 22ª Fest Comix. A graphic novel escrita por Raphael Fernandes e desenhada por Rafael Vasconcello, o repórter fotográfico Félix Panta vai a procura de sua namorada Lenina, presa pelos militares durante uma manifestação de estudantes.

Tudo na história gira em torno da fotografia, desde o enredo até mesmo o desenho dos quadros, contrastes e iluminação. Conversamos com os autores para saber mais sobre a relação do fotojornalismo na história, onde o personagem principal vive um dos períodos mais conturbados da história brasileira: a Ditadura Militar, ou Anos de Chumbo.

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iPhoto Channel – Como surgiu a ideia do personagem principal ser um fotógrafo?

Raphael Fernandes (escritor) – Quando trabalhamos o gênero noir, precisamos construir o personagem que investiga a trama com habilidades e conexões que permitam uma investigação. No entanto, fica bem mais interessante que este personagem não seja um policial ou detetive particular. Na década de 1960, a profissão de fotógrafo de jornal colocava o profissional muito próximo de tudo o que estava acontecendo. O fato de ser jornalista permite que ele registre os fatos, mas sem poder interferir textualmente na construção da notícia. Seria como ser uma testemunha, mas não poder fazer nada. Essa impotência é um reflexo do sentimento de artistas e comunicadores diante de algumas ações dos militares nos Anos de Chumbo.

 iPhoto Channel – Como se desenrolou a pesquisa para criar este personagem? Você entrevistou fotojornalistas da época?

Raphael Fernandes – Toda a pesquisa de Ditadura No Ar foi feita de forma caótica. Meu objetivo era romper completamente com os vícios dos historiadores, que tanto me incomodavam durante a graduação em história. Queria colher fatos através de fontes não tradicionais, por isso, me dediquei a conversar com pessoas mais velhas em ambientes informais, observar fotografias e tentar entender o que movia o fotógrafo e, principalmente, ouvindo a música da época.

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iPhoto Channel – Qual a influência que o papel de fotógrafo traz para o enredo?

Raphael Fernandes – O personagem principal é Félix Panta, um fotógrafo de uma versão fictícia do jornal O Pasquim. Dentro dos meus roteiros, a prioridade é sempre que tudo seja resultado da existência e ações dos personagens. Em outras palavras, a história toda é fundamentada no fato de Félix ser um fotógrafo. Da primeira cena até a última. Seja como testemunha dos fatos, vítima ou para se defender. Ele é fotógrafo até o tutano dos ossos.

iPhoto Channel – Em relação ao tratamento noir, como foi trabalhar esta linguagem dentro do quadrinho?

Rafael Vasconcellos (desenhista) – A estética do Film Noir, como um subgênero dos filmes de suspense e mistério, começou a se desenvolver lá nos clássicos do Expressionimo Alemão, onde a o contraste na iluminação e as sombras tiveram um papel fundamental na narrativa visual e no estilo, tendo uma relação muito íntima com os subsequentes filmes policiais nas décadas de 1930 e 1940.

O noir é, portanto, ao menos em seu princípio, uma estética fotográfica. Enquanto o cinema adotou as cores em sua narrativa, foi também nos quadrinhos policiais e de terror que o estilo floresceu e ganhou essa presença no imaginário popular como aquelas histórias de detetive casca-grossa, de mistério, fatalismo e ambientes enfumaçados.

Félix ser um fotógrafo é muito interessante nesse sentido, uma vez que vemos a história por sua própria ótica, cheia de contrastes, dentro de um cenário de limites morais enfumaçados. Embora seja composta pra receber cores, o tratamento artístico utilizado em Ditadura No Ar foi muito natural por conta do próprio imaginário que existe acerca da estética Noir, que cai como uma luva nesse período da nossa história cheio de medo, inquietação e paranoia.

 

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