Ser e não ser, a questão de Stefani Santos

A câmera sempre serviu de espelho e atualmente é mais do que comum apontar a lente para si próprio – vide a moda dos “selfies”. Neste caso, trata-se de marcar uma passagem, de dizer: “Estive aqui”. Stefani Santos tem a si como modelo, mas sua relação com o autorretrato não é de lugar. É uma questão de ser – ou de não ser.

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Stefani tem 25 anos de idade e mora em Florianópolis (SC) há dez anos. Natural de São José do Rio Preto, está concluindo o curso de artes visuais na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), que tem frequentado nos últimos cinco anos. Chegou à fotografia por meio da performance e estabeleceu o que chama de fotografia performática há apenas dois anos.

“Eu pratico exercícios de criatividade desde cedo mesmo. Penso que desde criança. No interior de São Paulo meu pai fazia molduras, e eu cresci convivendo com artistas”, explica Stefani, que entrou na faculdade com o objetivo de ser pintora, algo que já praticava desde a adolescência. Aí veio a performance, pelo trabalho de artistas como Marina Abramic e Sophie Calle. Só que ela ficou mais interessada no registro do que na performance em si, daí ter pendido para a fotografia.

A paulista explica que a opção pelo autorretrato foi ditada pela economia. Mas há outros aspectos envolvidos: “O meu corpo é o que eu tenho de mais seguro e barato. Usar o próprio corpo é ir além do dispor de si, seu corpo é levado para além dos limites de uma identidade pessoal própria, se torna um corpo qualquer”, afirma.

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Santa Ceia das Madalenas, realizada este ano: concessão a participações
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Segundo a artista, a opção pelo
autorretrato foi ditada pela economia

Do mesmo modo, são simples as suas produções, embora o resultado sugira o contrário. “Hoje, o que eu tenho é um processo bem solitário, tudo é pensado e feito por mim de maneira simples. O que me ajudou muito foi o curso de cenografia que fiz em Portugal, na Universidade do Porto, onde aprendi a criar uma aura na cena sem grandes recursos, apenas tentando ir no conceito de cada cena, como a fotografia Algotãodoce, em que eu narro a diferença usando apenas algodão-doce e uma mesa”.

Segundo descreve, o processo implica uma primeira foto da cena, depois ela dispara para diante da câmera, onde ocorre o que chama de “trabalho”. Já aí surgem duas personalidades distintas: a fotógrafa e a modelo – com esta última, a paulista procura guardar certa distância.

“Eu não penso na Stefani sendo retratada, mas sim uma cena, e um corpo. Poder-se-ia pensar até que meus trabalhos seriam uma projeção ou um querer ser. Não ser mais quem se é, ser outro, dissipar-se em ninguém é o que eu quero propor, uma construção de personas e cenas, onde o corpo do artista é investigação, é ausente de gênero, idade ou cor. A arte me possibilita ser quem eu quiser ou escolher, ou simplesmente não ser”, conclui.

Volta e meia, é necessário contar com outras personagens, como no caso da imagem Santa Ceia das Madalenas, realizada este ano. Nesse caso, Stefani não vê problema em contracenar: “O que me levou a essa imagem foi a pergunta: e se essa história fosse contada por mulheres?” Porém, tudo sempre tem relação com seu corpo e uma série de sentimentos que sua relação com o mundo enseja – com o “dilema diário que flutua entre a leveza dos prazeres celestes e as obrigações e deveres do porto seguro terrestre”, como conceitua a artista. “É nesse sentido que aparece a dificuldade de classificar uma série de fotografias onde eu sou minha própria modelo. Ora, eu nunca estou lá”, argumenta.

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Foto da série O phátos da ninfa, com releituras de obras icônicas da história da arte

No momento, a paulista está trabalhando na série O páthos da ninfa, iniciado no ano passado, através da qual promove releituras de imagens consagradas na história da arte. “Outro ainda está em fase bem embrionária e ainda não me sinto segura para falar sobre, mas, de um modo geral, eu sempre penso em uma imagem para me referir a qualquer tema. Eu manifesto o que penso por imagens, às vezes um livro que li, um debate que participei”, observa.

Stefani costuma publicar as imagens em sua fanpage. No que diz respeito ao aspecto puramente prático da questão, a artista procura expor sempre que possível o seu trabalho – “trabalho feito é trabalho no mundo”. E vender, logicamente: “Meus planos são, como de qualquer artista, poder viver do meu trabalho”, resume.

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