O caminho de Helena Wolfenson

Foto: Helena Wolfenson
Imagem da série “Love Stories Suck”, de Helena Wolfenson

Ter o filho seguindo o mesmo caminho profissional em geral é motivo de orgulho para um pai: seu legado não se perderá. Para o primeiro, há um porto seguro para onde conduzir seus esforços. Há experiência a ser compartilhada, temperada por laços que apenas se estreitam mais. Mas há outro aspecto a considerar: um pai bem-sucedido, reconhecido em seu meio, pode lançar uma sombra capaz de obscurecer seu herdeiro, impondo a este um fardo que o impeça de voar. E assim surge o paradoxo: ainda que seguindo o mesmo caminho, é preciso achar a sua própria trilha.

Helena Wolfenson carrega no sobrenome a excelência de um fotógrafo que pertence à galeria dos maiores do Brasil. Cresceu num ambiente impregnado de imagens e cedeu ao seu chamado. Mas a influência paterna foi apenas uma das variáveis que a fizeram se tornar fotógrafa.

“Lembro-me de quando eu era pequena, meu pai estava fazendo o seu primeiro livro de retratos (Jardim da Luz) e as ampliações muitas vezes iam parar na mesa da sala, onde minha mãe, os amigos e às vezes até nós, filhas, palpitávamos sobre qual foto deveria estar ao lado de qual”, conta Helena, paulistana de 25 anos de idade, atualmente vivendo em Nova York como forma de pavimentar seu caminho autoral.

Ela desembarcou na capital norte-americana em agosto do ano passado, para cursar o International Center of Photography. Pretende esticar a permanência por mais um ano. Atualmente, desenvolve uma série chamada Last Stops, sobre as paradas finais dos metrôs da cidade. “Comecei fazendo com uma câmera de grande formato, 4×5, e agora migrei para uma médio formato 6×7. Os formatos maiores e a necessidade de se ter um tripé e fazer retratos mais lentos e com muita definição de detalhes me levaram a criar certo momento de encontro com as pessoas [que vivem próximas] das últimas paradas”, explica.

Foto: Helena Wolfenson
Imagem da série “Last Stops”, seu trabalho mais recente

Foto: Helena Wolfenson

Essa proximidade certamente foi um desafio. “Uma vez, escutei uma frase de algum grande fotógrafo americano que agora não me recordo o nome, que dizia que todo fotógrafo foi um dia um tímido. E eu era”, admite, recordando uma viagem a Cuba, em 2006: “Cuba despertou em mim muita curiosidade, era um lugar totalmente novo, ambíguo, dissonante e familiar numa mesma ilha. E foi através da câmera que eu me aproximei e ao mesmo tempo me distanciei das pessoas de lá, pois tenho a impressão de que a câmera é como um passaporte, uma desculpa, uma porta para mundos que eu não entraria, mas que também faz com que nos escondamos atrás dela”, avalia.

Foto: Theo Craveiro
Helena Wolfenson: na infância, palpites no trabalho do pai (foto: Theo Craveiro)

A faculdade de jornalismo seguiu paralela a essas descobertas. Com ela, seu engajamento no texto. Helena ficou dois anos na redação da Brasileiros e depois foi para a Sarafina, do grupo Folha. “Lá, fui mudando de área, era coordenadora de fotografia da revista. Fiquei uns meses lá. Mas o escritório me sufocava, sentia necessidade de criar, de estudar e aprofundar. A rua sempre me inspirou mais”. Assim, ela decidiu ajustar seu leme em direção ao fotodocumentário e fez as malas rumo aos EUA.

O curso no ICP previa um trabalho de conclusão. Helena concebeu Love Stories Suck, sobre uma artista nova-iorquina de 63 anos, Lucy Mahler, que na juventude foi ativista política e hoje vive solitária em seu apartamento no Brooklin Heighs. “Lucy nunca se casou, viajou sozinha o país em seu trailer por seis meses, deu aulas de artes a crianças, e hoje, depois de ter sobrevivido a um câncer, ela segue a dança como terapia, arte e vida. Vive com pouco dinheiro e se assusta com o ritmo frenético da cidade”, descreve. A existência anacrônica e depressiva da mulher, sua origem judaico-comunista, encontraram eco na própria vivência da fotógrafa: “Lucy foi para mim um encontro e uma porta para eu olhar para a minha própria história. Meu trabalho acabou virando uma busca para entender a depressão de uma nova forma, pois Lucy não é somente deprimida, ela é complexa, com todas as suas formas, e sugere que dancemos com todas as nossas facetas”, reflete.

Foto: Helena Wolfenson

Foto: Helena Wolfenson

Falar em raízes inevitavelmente nos remete à herança de Helena. A jovem que ganhou do pai sua primeira câmera fotográfica, uma Nikon FM2 que ele mesmo usara, sabe que existe uma pressão implícita na condição de ser “a filha do Bob Wolfenson”. Isso é algo que a incomoda, mas não a ponto de fazê-la querer negar a ascendência artística: “Sempre que tiro dúvidas ou peço que ele me ajude a editar trabalhos, ele faz com muita paciência. Acho que isso é uma troca incrível que temos”, afirma. Por outro lado, ela sabe que é preciso encontrar o próprio olhar, sua própria sintaxe. “O foco do meu trabalho eu ainda estou descobrindo, mas me interessa explorar os limites do documental, não como um retrato da realidade, mas como uma forma de olhar para ela”, pondera, com a tranquilidade de quem está trilhando o próprio caminho.

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