Autoral: o corpo para além do óbvio

Retratar o corpo feminino sob as mais diversas formas de interpretação, porém tangenciando o óbvio. Esse é o compromisso que Carlos Café, um professor de artes, arquiteto e artista visual atribuiu à sua produção fotográfica e audiovisual. Paulistano, 33 anos de idade, Carlos vive há nove anos em Brasília, quando foi com planos de ficar apenas três, porém permaneceu diante da “revolução” que a cidade promoveu em seu olhar.

“Brasília instituiu uma outra relação no meu cotidiano, incluindo aspectos de reconhecimento do corpo e apreensão do espaço ‘urbano’. Nesse sentido, surge na minha trajetória uma necessidade de me expressar por meio de outra linguagem e a partir de um outro tema – fotografia, vídeo e corpo”, explica Carlos que, por outro lado, já lidava com esses suportes e essa temática no final dos anos 1990, quando cursou arquitetura em São Paulo. “Nessa época, já fotografava experimentalmente corpos anônimos nas ruas da capital. No entanto, a investigação sobre o corpo como principal suporte dos meus trabalhos começa em 2004 e realizei minha primeira exposição em 2006”, detalha.

O fato de desenvolver um trabalho autoral, sem a preocupação de atender a demandas do mercado, possibilita ao artista assumir uma estética que ele define como anacrônica, embora inserida no contexto da arte moderna: “Busco a plasticidade do corpo independente do seu estereótipo, tipologias, padrões ou imposições de influências midiáticas mercadológicas. Para mim, não existe um corpo ideal, ao longo da história da arte esse padrão se modifica e sinceramente ainda me interesso mais pela estética dos corpos do século 19”, afirma o artista, que considera “frívola e inconsistente” a maneira como essa questão tem sido abordada atualmente, com a superexposição do corpo enquanto produto pelos meios de comunicação, em especial por artes da publicidade, o que resultou na imposição de um ideal de beleza estéril e artificial.

“Mas é claro, existem exceções. E nessa contracorrente há um híbrido campo de multilinguagens onde se encontram alguns fotógrafos dedicados a um trabalho conceitual e experimental (principalmente no campo da moda), onde se ressalta uma produção que questiona cânones estéticos e produz uma crítica criativa de contraposição a essa estética publicitária que exacerba o corpo como símbolo de consumo”, pondera.

Carlos Café: subversão de cânones e sublimação do erotismo (foto: autorretrato)

Entre os fotógrafos que trilham a via alternativa, Carlos cita a norte-americana Autumn Sonnichsen, cujo trabalho exerceu influência sobre sua pesquisa – ainda que de modo indireto. “Eu acompanhava sua produção fotográfica pelo blog que ela mantinha na Nerve (quando a Nerve ainda tinha uma seção específica para fotógrafos). Atualmente, a Autumn vive entre Nova York, Berlim e São Paulo, e foi quando ela veio morar no Brasil que eu a conheci e ficamos amigos. Em 2009 ela fez a curadoria de uma exposição individual minha. Gosto muito da maneira como ela encara os projetos autorais e comerciais – existe uma espécie de inter-relação entre os projetos artísticos e publicitários”, observa.

Ainda no campo das influências, Carlos Café inclui entre as suas outros fotógrafos, artistas visuais, cineastas e videomakers (ele menciona Kertész, Man Ray, Matthew Barney, Jenny Saville, Lucian Freud, Araki, Helmut Newton, Vanessa Beecroft, Peter Greenaway, Daikichi Amano e Marina Abramovic), pois vê a relação entre essas expressões artísticas como algo importante para a construção da cultura pós-moderna. A essência do meu trabalho parte sempre de uma ambição pela superação da obviedade de representação do corpo, da subversão dos cânones da técnica fotográfica, da transmutação do olhar sobre sua volumetria e da sublimação do erotismo”, conceitua.

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8 Comentários

  1. Excelente o trabalho do Carlos Café. Como professor, arquiteto, fótógrafo e artista que é, está sempre envolvido em novas propostas, novos projetos e uma busca constante em exercitar esse prazer que todos temos, que é viver.

  2. Caco, sua estrela é giga, intensa e seu olhar algo raro e muito intuitivo. gosto muito do seu investimento na arte, naquilo que acredita e no seu foco. que delícia poder acompanhar sua evolução. e que a gente siga junto por muitos 5 years from now. grande beijo tatá

  3. De fato, muito além do óbvio! Obrigado, Café, por nos presentear com perspectivas tão incomuns do corpo, que nos tiram da transparência e nos fazem parar pra pensar.

    Abraço, dos amigos e clientes

    AH&E