Portfolio online, pode?
O portfolio fotográfico pode ser exibido em site ou página virtual? Essa questão me tem tomado algum tempo de reflexão e acabei chegando a uma conclusão que, embora fundamentada no texto legal, até o momento é minoritária.
A letra fria da Lei dos Direitos Autorais (LDA), em seu artigo quinto, considera “publicação” o “oferecimento de obra literária, artística ou científica ao conhecimento do público, com o consentimento do autor, ou de qualquer outro titular de direito de autor, por qualquer forma ou processo”.
Do mesmo modo, entende “comunicação ao público” o “ato mediante o qual a obra é colocada ao alcance do público, por qualquer meio ou procedimento, e que não consista na distribuição de exemplares”.
A LDA ainda faculta ao autor o direito exclusivo de “utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar”.
Considerando que o fotógrafo será sempre o autor de sua fotografia, pois não pode abrir mão desse fato mesmo que os direitos patrimoniais tenham sido alienados a terceiro, ele pode divulgar sua criação.
Tal divulgação não se restringe a algum meio (somente papel, por exemplo), pois a lei prevê qualquer meio, já conhecido ou que se invente no futuro.
O legislador aqui previu inúmeras possibilidades, inclusive o meio virtual. A rede internacional de computadores, neste caso, seria o suporte, e uma página virtual (site, por exemplo), seria o meio de expressar a obra. A LDA também não limita essa divulgação nem de forma ativa (visitar um cliente e levar o portfolio) ou passiva (receber visitas no site).
Vale destacar que o termo “portar-folhas” (portfolio) pode ser relativizado, já que os dicionários dão como sinônimo de “folha” a palavra “página”, que por sua vez, no mundo virtual, são os arquivos que ficam dentro de um site.
Portanto, concluímos que o fotógrafo sempre poderá divulgar, por qualquer meio, seu portfolio, independente do suporte que o contenha (físico ou virtual), desde que não atinja a honra ou a respeitabilidade do indivíduo fotografado nem a foto tenha fim comercial.
Quanto ao conflito de princípios constitucionais (direito de propriedade versus direito de imagem), entendemos que, desde que não atinja a honra e/ou a respeitabilidade do sujeito fotografado e este tenha ciência de que estava sendo fotografado, não há que se falar em prevalência do último direito.
A doutrina majoritária entende que, quando há conflito entre “bens jurídicos” com o mesmo patamar de proteção (propriedade, imagem), a solução virá com a análise do caso concreto. Ou seja, não existe “direito absoluto”, que se sobreponha a outro de forma automática, mas sim valoração casuística desse choque de normas/regras/princípios. Nesse caso, os bens jurídicos protegidos estão sendo relativizados com intuito de solucionar o conflito.
Porém, alguns requisitos devem ser cumpridos para que o direito de divulgar o retrato (obra do fotógrafo) possa valer e ser defendida numa ação judicial (caso concreto):
a) Ciência do fotografado no momento do “clique”;
b) Consentimento do fotografado, seja expresso ou tácito;
c) Que o conteúdo/contexto da fotografia não fira a honra, a boa fama ou a respeitabilidade do retratado ou se for destinado a fins comerciais.
Na hipótese de o fotógrafo cumprir os requisitos acima, ele poderá exibir um retrato que tenha feito em seu site sem violar qualquer preceito legal.
MARCELO PRETTO é fotógrafo de moda, retrato e publicidade musical, com trabalhos internacionais realizados no decorrer de sua carreira, professor de fotografia e advogado atuante em São Paulo. Especialista em direitos autorais pela FGV e consultor jurídico a colegas fotógrafos, desenvolveu o módulo “Direitos autorais, direito de imagem e direito de fotografar”, com artigos publicados em revistas sobre o tema.
.
Só acrescentando uma dica: Sempre incluir nos contratos de qualquer serviço fotográfico (seja casamento, ou um simples book de recém-nascido) uma cláusula especificando que o cliente autoriza o uso das imagens para uso não-comercial, ou seja, para fins de portfólio (divulgação do trabalho).
desculpe era pra ser só o segundo comentário, não esse primeiro.
Sugestão: Sempre inclua em qualquer contrato de qualquer serviço fotográfico a seguinte cláusula:
“A CLIENTE (ou CONTRATANTE) não se opõe quanto ao uso das imagens dos noivos registradas durante o evento e ensaios ao ar livre bem como dos convidados presentes ao evento pela CONTRATADA, uma vez que tais imagens passarão a fazer parte de seu novo acervo, não se cogitando neste caso a aplicabilidade da Lei 9.610 de 18/2/98 (Lei dos Direitos Autorais) tendo em vista que serão liberadas para uso exclusivamente não-comercial, sendo apenas para mostruário e portfólio, website e fan-pages da empresa, amostras de material fotográfico, concursos internos e externos e outras publicações exclusivamente relacionadas à divulgação do trabalho da empresa CONTRATADA. ”
O que acha Marcelo?
Acho ótimo! Quando há esta cláusula ou outra do gênero não há o que se discutir. O problema é justamente quando não há nada tratado. Aí o fotógrafo pode se valer da Lei de Direitos Autorais, que conforme citado acima, já prevê o direito moral do autor de poder expor / publicar sua obra.
“A letra fria da Lei dos Direitos Autorais (LDA), em seu artigo quinto, considera “publicação” o “oferecimento de obra literária, artística ou científica ao conhecimento do público, com o consentimento do autor, ou de qualquer outro titular de direito de autor, por qualquer forma ou processo”.”
Valeu pela contribuição Marcos Paulo!!! Abraços!!!
Excelente texto. Elucida vários pontos que sempre me perguntei. Uma dúvida me surge, e se a foto não for de uma pessoa mas de um local? Por exemplo foto feita de fora de uma propriedade ou de um parque?
Existem parques que dizem que nao podemos fazer fotos e colocar “divulgada” em nosso site. Mas nesse caso posso entender que posso divulgar a foto como portfolio?
Olá Mardem!! Favor ler o texto sobre “local público” aqui na coluna. Grande abraço!!
Olá Marcelo!
Adorei o post e no fim fiquei com outra dúvida. E se o fotógrafo criar um video de divulgação do seu trabalho, como fica o direito autoral da música usada? Posso usar a música do meu cantor favorito sem problema?
Tks!!
Olá Bruna!! Obrigado por participar!
O autor da música, o intérprete e os demais componentes da banda, além do detentor dos direitos patrimoniais (provavelmente a gravadora), têm a mesma proteção que o fotógrafo, pois a LDA os protege igualmente a nós. Portanto, para se utilizar uma música é necessária a autorização do autor. Caso contrário estará violando o direito autoral de seus detentores. Grande abraço!!
Bacana Marcelo. Obrigada pela resposta!
Acho também muito interessante mudar na cláusula acima o item de que o contratante autoriza o uso da imagem como portifólio não pelo contratado, mas sim pela equipe do contratado, ampliando aí os direitos morais dos fotógrafos.
O Brasil já está adequado às leis da Creative Commons? Além de fotografo-semi-amador (haha) também sou (ou me acho) escritor e minhas postagens são tipo “CC-BY” (se não me falha a memória) onde eu autorizo a livre divulgação desde que mantidos os créditos… acho que assim seria bem mais interessante pra todo mundo! Pra quem usa e pra quem é o “divulgado”
Bom, “creative commons” são obras disponibilizadas por um autor inicial que tem o objetivo disponibilizá-la a fim de permitir que outras pessoas criem a partir daquela obra. O autor permite o acesso ao público de sua obra na forma de “modelos abertos”, ou seja, disponibiliza algumas licenças para que a coletividade utilize suas obras a partir das licenças liberadas. As obras são todas aquelas protegidas pela LDA, p. ex.: foto, musica, software, filmes, textos, etc. O “creative commons” é chamado de projeto colaborativo e muito utilizado na ciência e tecnologia. Na fotografia ao vejo tanta aplicabilidade, mas pode ser um proposta de criação com a coletividade. Lembramos, que o “creative commons” não se confunde com o conceito de Coletivo, cujo tema falaremos mais prá frente.
(fonte: Direito autoral na era digital, Manuella Santos, Ed. Saraiva).
Na verdade na LDA que é de 1998, já há previsão quanto à cessão de direitos. O “creative commons” não passa de uma cessão, onde o autor define o que realmente será cedido. Mas temos que lembrar que, se todos começarem a ceder o direitos de sua obra, a fotografia profissional será muitíssimo prejudicada, haja visto que o cliente ou o cessionário quer mais é usar a foto e não pagar por isso. Sem direitos cedidos já há abuso, imagine com a cessão.
Obrigado por participar, grande abraço!!