Numo Rama: um olhar sobre a fotografia potiguar

Foto: Sussa Rodriguez

Arte em constante movimento, a fotografia contemporânea brasileira encontra maior repercussão no eixo Rio-São Paulo e em outros centros de reconhecida excelência, como o Pará. Isso não quer dizer, porém, que não haja uma produção consistente em pontos diversos do mapa. Mostrar essa verdade é o objetivo de iniciativas como a que ocorre no Rio Grande do Norte, por meio da Associação Potiguar de Fotografia (Aphoto) e Duas Estúdio, responsáveis por convocar fotógrafos do estado a se mostrarem ao país.

A Aphoto e o Duas Estúdio, das fotógrafas Elisa Elsie e Mariana do Vale, idealizaram a exposição Expo Contemporânea 2012, em exibição no Solar Bela Vista, em Natal, até dia 5 de setembro. Foram selecionados vinte fotógrafos locais, cujo trabalho apresenta uma visão moderna do estado. A curadoria coube ao sul-mato-grossense Marcelo Buainain e ao paraibano Numo Rama, ambos radicados em Natal.

Numo, 44 anos de idade, vive na capital potiguar desde o início dos anos 2000, após morar um tempo no exterior. Vencedor do prêmio Porto Seguro de Fotografia em 2004, ele acredita no potencial da fotografia do estado, porém faz algumas ressalvas. Acompanhe a entrevista que Numo Rama concedeu ao Photo Channel:

Como se deu o convite para participar do projeto e como foi para você a tarefa de apresentar alguns valores da fotografia potiguar? Há duas meninas muito interessantes fazendo as coisas se mexerem por aqui, que são Elsa Elisa e Mariana do Vale, e estão começando a promover eventos voltados para o deslocar da fotografia do RN. Ângela Magalhães, Tiago Santana, Isabel Amado e João Ripper vieram recentemente semear no solo do RN através das duas e o fotógrafo Marcelo Buainain. Também há o José Frota e, mais recente, Leonardo Costa Braga morando por aqui. São bons fotógrafos e o mais interessante é que são pessoas inteligentes. É preciso saber do que se tem e efetuar curadorias mais críticas, fomentar workshops, fazer exposições e muito mais para nortear com vigor a fotografia do Rio Grande do Norte. Venho acreditando no trabalho delas e, portanto, aceitei a proposta.

Foto: Denis Job
Foto de Denis Job, uma das escolhidas a integrar a Expo Contemporânea 2012

E como você avalia a atual fotografia no estado, especialmente a contemporânea, que foi o alvo dessa iniciativa? Essa curadoria foi uma parceria com Marcelo Buainain. Há bons fotógrafos, mas há o medo de se expor, ser “criticado”, não ser “escolhido”, de não querer ouvir uma opinião sincera sobre seu trabalho. Mas há muitos talentos e precisam “entender” o que estão fazendo com uma câmera na mão.  As meninas são competentes e creio que elas estão sabendo provocar o lado bom disso tudo. Há uma fotografia interessante despontando. Mas há uma tendência mais generalizada como forma de expressão. Isso não é bom. Seria interessante para os fotógrafos fazerem uma releitura de sua própria cultura através das nuances da subjetividade e até mesmo do realismo. Recentemente, o fotógrafo Hugo Macedo mostrou-me uma série de fotografias sobre a pega de boi no mato feita por vaqueiros tradicionais. O ensaio está dentro do realismo, mas há uma força própria e uma dinâmica excelentes. Não foi preciso cair no soft do conceitual. Há muita coisa para ser fotografada nesse começo de século e é preciso ver com a alma como elas realmente são.

Como você posiciona a fotografia potiguar no contexto da fotografia brasileira, cujos centros de excelência estão no eixo Rio-SP e polos como o Pará, por exemplo? É natural que esse eixo predomine. As artérias do poder econômico pulsam ali. Nem Paris pôde resistir ao poderio econômico de Nova York. Aqui há um movimento se armando para galgar mais consciência de si próprio. Creio que não é o momento exato para fazer essa comparação, mas há indivíduos com capacidade de desenvolver belos trabalhos e serem bem representados em nível nacional.

Que temáticas essa fotografia explora, quais as linhas de discurso e os desafios que enfrenta? As temáticas são muito variadas e o mais interessante é a presença forte dos elementos rurais. Vê-se nisso um rever de valores culturais que parece que vai sofrer extinção e está sofrendo. Creio que o maior desafio será integrar todas essas formas de expressão dentro de uma fotografia mais elaborada e criativa. Buscar sua própria marca em cada imagem, não ter medo de errar, mostrar, discutir, brigar pelo que se acredita, pois só assim poderemos avançar e nos integrar com maior qualidade na expressão fotográfica brasileira.

 Quando se trata de montar um ensaio com fotografias eu não tenho o menor apego” 

Que questões ficaram evidenciadas na mostra? Os fotógrafos deverão cair com mais força em campo. Trabalhar árduo e procurar superação em tudo que realizarem no âmbito da fotografia. Há talentos e isso é o que mais importa. Agora, saber o que fazer com ele é o mais importante.

Foto: Alexandre Santos

Foi um trabalho difícil essa curadoria? Como foi o processo? Hoje vivo imerso numa fazenda onde trabalho com cavalos e outras atividades de rancho. Essa curadoria foi dividida em três partes por questões de logística. Marcelo Buainain fez uma parte e eu outra. Ambos enviamos para Elisa e Mariana e elas finalizaram o resto do trabalho. Foi democrático. Quando se trata de montar um ensaio com fotografias eu não tenho o menor apego. Penso muito na reação das pessoas que vão ver as imagens e o grau de complexidade que pode envolvê-las. Assim, o critério de escolha fica muito rigoroso e poucas imagens sobrevivem a esse processo dentro do que se está propondo. Se as imagens são minhas aí tudo piora e o tempo se estende indefinidamente.

Foto: Emilio Orestes Angelo

 

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