Embora seja assunto superado, o movimento de popularização da fotografia (banalização, diriam alguns) ainda dá o que pensar a muitos profissionais da área. O motivo de maior ressentimento é sem dúvida o aumento da concorrência, com a consequente e inevitável queda no valor dos orçamentos. Há quem lastime ainda o pouco apreço dos mais novos pelo entendimento da técnica – preferem, antes, confiar no modo “Auto” de suas potentes câmeras. Mas, para todos que coçam a cabeça diante desse cenário de catástrofe, lamentamos, as notícias não são boas: ainda vai piorar.
No que diz respeito à maneira como as pessoas aprenderão fotografia, a lei do menor esforço em alguns anos deverá se consolidar. “Elas [as câmeras] pensarão por nós”, prevê Fructuoso Navarro, fotógrafo espanhol autor de sete livros sobre técnica fotográfica e professor de fotografia. Versátil, Fructu – como costuma assinar alguns trabalhos – transita por diversos segmentos e divide sua base de operações entre Espanha e Estados Unidos (possui dupla nacionalidade). Além disso, atua como consultor de alguns fabricantes – daí o fato de o que ele diz não ser mero achismo.
“Não teremos mais necessidade de DSLR, e sim de um dispositivo de captura associado a outros que no momento estejamos utilizando, por exemplo, telefones celulares, relógios etc.”, reforça o fotógrafo, cujos primeiros passos na área foram dados na infância, na cidade de Valência, sob a batuta de Don Manuel, um velho fotógrafo de quem recebeu as primeiras lições. Mais tarde, Fructuoso exercitou seu tino comercial vendendo livrinhos de fotografias artesanais aos colegas de escola.
“Esses livrinhos consistiam em pequenos cadernos onde estavam as fotos de todos os membros de cada classe, inclusive os professores. O curioso é que muitas daquelas fotos tinham sido ‘roubadas’ (ou seja, tiradas sem que a pessoa soubesse), como, por exemplo, as dos professores durante as aulas. Como não contava com zoom nem lentes potentes, depois de capturar essas fotos ia até o quarto escuro, as ampliava e recortava para adicioná-las como parte do material que entregaria para meus clientes”, conta.
Depois dessa primeira experiência comercial, Navarro se tornou profissional de fato aos 21 anos de idade. Atualmente, tem se dedicado principalmente ao ensino da fotografia, em universidades, cursos privados e conferências. E também aos livros: acaba de lançar mais um, HDR: novas ferramentas e novas técnicas 2014.
Para Fructuoso, os novos tempos exigem dos fotógrafos estabelecidos um reajuste de rota. “Em todas as profissões a renovação é uma necessidade. Acredito que o que acontece na fotografia é que os profissionais mais antigos deveriam reconsiderar sua posição se virem o volume de trabalho baixar. Eles devem tentar se especializar numa área ou, simplesmente, tentar se mexer para novos espaços. Em geral, o fotógrafo que acaba de chegar vive num estado de felicidade, pois não consegue ter alguma situação de referência que permita avaliar seu crescimento. Para ele, tudo é novo, por isso ele é feliz. Aquele que já está estabelecido por mais tempo é quem realmente sente com mais força as mudanças do mercado, pois precisa reajustar a estrutura do seu negócio às novas tendências”, avalia.
Segundo o fotógrafo, essa capacidade de adaptação tem a ver com a disposição em dominar novas técnicas. Por isso, ele procura popularizar algumas delas por meio dos livros. O HDR, por exemplo. Mas Fructuoso faz uma ressalva: não é toda imagem com aspecto pictórico que pode ser chamada HDR. “O HDR não é uma fórmula visual e, sim, uma técnica de produção que permite mais realismo do que habitualmente capturamos. Na indústria do cinema, apenas se concebe a criação de um filme se houver um alto valor de alcance luminoso e, ainda assim, o aspecto de uma produção cinematográfica não é precisamente pictórico. Algo parecido acontece com o 3D, um tipo de fotografia que tenho procurado aproximar do grande público”, afirma.
Ele também menciona o vídeo entre as inovações. A fabricação de câmeras reflex com atributos de filmadora full-HD tem revolucionado o mercado de captação de imagens e obrigado os profissionais a desenvolverem conhecimentos nessa área. Fructu, no entanto, chama a atenção para outro aspecto: a edição dos frames da imagem em movimento permitirá obter “planos perfeitos”: “Em outras palavras, quando gravarmos uma cena, teremos um volume de possíveis imagens fixas muito grande, e poderemos selecionar apenas aquelas que mais nos interessem. Como resultado disso, as possibilidades de seleção e, portanto, de conseguir a melhor imagem, aumentam enormemente”.
Como alguém que tem boa parte do trabalho voltado para o ensino de técnicas fotográficas, prever um futuro dominado por dispositivos de imagem inteligentes pode parecer perturbador. Uma fotografia mais dependente da criatividade que da técnica. Isso não o preocupa, tanto que repete incansavelmente em seus workshops: não importa se a imagem não é perfeita, desde que consiga dar o recado. “Acredito que, se a técnica se une a um bom sentido artístico e a uma boa forma de ver, se pode conseguir uma diferenciação que é do que, ao final, se trata a boa fotografia”. Assim, não fique obcecado pela técnica, relaxe: “Penso que cada um deve fazer o que o faça mais feliz e criar aquilo que lhe der mais satisfação. Se as técnicas ajudam você a criar o que procura, isso é o que realmente importa, no final”. Ou seja, ainda há luz no fim do túnel.
(*) Colaborou German Toldo