Fotógrafo na sala de parto: a vida em PB

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Para Renato dPaula, a vida começa em preto e branco. É desse modo que ele, discreta e sistematicamente, registra com rigor de fotojornalista cada instante do nascimento de uma criança: a expectativa, a tensão dos familiares, o trabalho meticuloso dos médicos e, enfim, a explosão de emoção e lágrimas com que a mãe saúda, num primeiro olhar, o seu filho recém-nascido.

Não se pode dizer que Renato, de 31 anos, seja um fotógrafo de partos. É antes um fotógrafo de família, um fotógrafo social que passou a frequentar corredores de hospital por exigência da demanda. Paulistano, formado em publicidade e propaganda, está fotografando há apenas cinco anos. Quatro deles dedicados exclusivamente à fotografia de casamento. Seu ingresso na profissão segue o enredo clássico do amador que muda de categoria quase sem perceber: “Quando me deparei, já era um fotógrafo profissional e o que fiz foi pedir demissão da empresa em que trabalhava para abrir a minha própria empresa”, resume.

Renato tem o trabalho avalizado por quatro associações internacionais de fotografia casamenteira. “Faço parte de quatro, mas já fui membro de cinco”, esclarece, acrescentando que outras duas o teriam de bom grado, mas ele preferiu declinar do convite: “Já não dava conta de participar de todas”. Associações, basicamente, promovem concursos para ranquear seus sócios. Renato obteve já boas colocações, mas também anda dando um tempo nisso. Está tranquilo em relação a sua própria condição.

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Fotografia documental: Renato registra todos os momentos que antecedem ao parto com rigor de fotojornalista. O preto e branco, a textura e o ruído são algumas das características do seu trabalho

O olhar que leva para a sala de parto é o mesmo com que vê o casamento: essencialmente documental. “Eu quero registrar a verdade, por mais que a fotografia não a revele”, sentencia. Em suas imagens ganham destaque o ruído, a textura e o contraste. “Isso é minha identidade fotográfica”, diz, admitindo influências do cinema e da fotografia de rua: “Aqui cito fotógrafos da agência Magnum como minhas principais referências, dentre eles Elliot Erwitt e Bresson, além do francês Robert Doisneau”.

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Quando a filha nasceu, Renato dPaula bateu pé para ter o fotógrafo que escolheu

Renato não vê a fotografia de parto como um segmento em si, mas uma extensão da relação que se estabelece com os noivos. Depois do altar, o fotógrafo, se agradou, terá um encontro marcado com a barriga da futura mamãe. E, como tem se tornado comum ultimamente, será chamado a fazer plantão na maternidade como se fosse um dos membros da família – só que com a câmera diante da vista.

Mas hospital, assim como igreja, tem suas regras. Algumas despropositadas, como a que estabelece qual profissional pode atuar naquele local – o que atrasa um pouco o deslanchar dessa modalidade. “Muitos hospitais praticam a venda casada”, explica melhor Renato, “e só permitem o registro de parto se for com a empresa que está localizada dentro da maternidade, com a qual eles têm contrato. Isso vai contra o Código de Defesa do Consumidor, mas são poucos os casais que vão além e brigam por isso”, reconhece, contando que ele próprio teve que impor sua vontade quando a filha nasceu, forçando a barra para ter o fotógrafo que desejava. Por outro lado, “alguns hospitais são muito éticos e permitem que outros profissionais registrem esse momento sem nenhum problema”.

Outras regras são muito bem fundamentadas, e uns poucos hospitais oferecem cursos para que o fotógrafo saiba como se portar. A maioria explica na hora, mas o primordial é não se tornar um estorvo: “Nesse momento, o fotógrafo é o profissional menos importante na sala e nossa função é não atrapalhar em absolutamente nada”, ressalta Renato, que procura um local neutro para se posicionar, comunicando à equipe médica com gestos ou olhares qualquer necessidade de movimento, cuidando para não encostar em nada.

“Uma coisa que jamais uso é o flash, e recomendo que não se use, principalmente no centro cirúrgico. Em primeiro lugar, por respeito à equipe médica que está trabalhando e os disparos do flash podem incomodar. A mãe também precisa de paz nesse momento. E para o bebê, que mal consegue abrir os olhos após o nascimento por conta da claridade, seria uma crueldade jogar o flash, que é uma luz bem forte. Aliás, o centro cirúrgico tem tanta luz que até um celular consegue tirar fotos sem luz auxiliar”, observa o fotógrafo.

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Fotografia de parto é uma extensão do trabalho de Renato, que é especializado em casamentos e faz fotografias de família

Apesar disso, ele recomenda um equipamento capaz de oferecer ISOs altos e também lentes claras. “Num dos nascimentos que fotografei, a mãe, ainda na sala de pré-parto, estava com dor de cabeça e pediu que todas as luzes fossem apagadas, restando apenas uma pequena arandela. Aquela arandela foi minha única fonte de luz durante 90% do tempo em que ela esteve nessa sala, o que foi aproximadamente umas 5 horas. Nesse caso, o equipamento foi essencial, trabalhei com ISO 20.000 em uma Canon 5D Mark III”, exemplifica.

Fotografar partos não exige só do equipamento. O profissional comprometido com a fidelidade do momento vai ter que encarar uma jornada longa, especialmente quando se tratar de um parto natural. “Eu passo o dia todo na maternidade com o casal, já que o registro não é somente do parto, mas de toda a expectativa e experiência que existe antes mesmo do nascimento. Isso é uma lembrança pra vida toda, especialmente para a criança que vai nascer. O registro do nascimento em si é uma parcela pequena do trabalho. Eu busco o registro dos pais e dos familiares nesse momento único, em que as emoções estão à flor-da-pele”.

Renato opta pelo preto e branco por duas razões. A primeira diz respeito às condições do trabalho. Há sangue envolvido e ele não quer que isso chame mais atenção do que o momento em si. A segunda é subjetiva: “Essa ausência de cores traz pra quem vê a foto mais impacto no que realmente aconteceu e foi registrando”, justifica, alertando que é preciso estar preparado para clicar a qualquer momento: “Eu não tiro a câmera do rosto. Como no casamento, os momentos acontecem quando menos se espera”.

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