Fotografia para crianças especiais

Não deixa de ser curioso o fato de alguém que pegou numa câmera pela primeira vez para fotografar peças de computador tenha se especializado num nicho restrito – e absolutamente emocional – da fotografia de gente: o retrato de crianças com necessidades especiais. Mas essa é, em linhas gerais, a história de Eduardo Guilhon, 32, o primeiro – e, até aqui, único – fotógrafo credenciado pelo Special Kids em Santa Catarina.

Special Kids Photography é um projeto internacional que capacita fotógrafos para lidar com essas delicadas crianças e suas famílias. Foi criado em 2000, nos Estados Unidos, por conta das experiências frustrantes de alguns pais dentro dos estúdios de fotografia. No Brasil, chegou em 2009, por iniciativa do fotógrafo de São Paulo Rubens Vieira, e já possui 90 profissionais certificados.

Eduardo conheceu o projeto no final desse mesmo ano. Já então, o ex-técnico de informática de Florianópolis (SC) se dedicava a fotografar books e a fazer retratos, após um ano de pesquisas, estudos e cursos que o habilitou a se assumir como fotógrafo profissional. “De início, esse tema já me chamou muito a atenção, pois nunca tinha ouvido falar e nem nunca pensei em criar uma área para esse tema. De imediato, entrei em contato com o Rubens e, após algumas trocas de e-mails, consegui trazer o workshop para Florianópolis”, conta.

Essa foi a segunda oficina do recém-criado Special Kids Brasil. De todo mundo que participou dos dois, Guilhon acha que foi o único que realmente deu seguimento ao que aprendeu. E com bons resultados: “Recentemente, publiquei um slideshow com o meu trabalho com crianças especiais em minha fanpage no Facebook que gerou mais de 210 compartilhamentos e 17 mil visualizações em apenas seis dias. Muitos me adicionaram, elogiaram, inclusive até alguns de outros estados pediram orçamento. É possível ver que divulgações como essa podem fazer a diferença. Afinal, por que uma família especial não pode ter um ensaio especial?”, questiona.

Eduardo Guilhon: reconhecimento dos pais é o suficiente para “ganhar o dia” (foto: Bernard Patury)

Não há razão para que não tenha. O projeto tem ajudado bastante nisso, porém alguns casos exigem muita conversa – tanto com os pais quanto com a criança – para superar os traumas de alguma experiência ruim. Porém, vencida a barreira, constatar a satisfação das famílias após o ensaio tem sido um motivador extra para o fotógrafo: “Quando você entrega as fotos e vê os olhos da mãe e do pai cheios de lágrimas, e aí eles olham para você e te dão um abraço apertado e falam um simples ‘obrigado’, isso é tudo que preciso para ter o meu dia perfeito e ter a sensação de missão cumprida, e que você pode fazer a diferença, pode mostrar que eles também têm direito de registrar seus momentos”, descreve Guilhon, que de tanto envolvimento com a causa até criou uma outra fanpage para troca de informações entre pais e familiares de crianças especiais, projeto que conta com 6.900 membros.

Claro que há dificuldades. As maiores dizem respeito a conseguir boas locações para se fotografar. Praticamente todo o trabalho é feito em externa, e o velho problema da mobilidade urbana, que já dificulta a vida de quem não necessita de meios especiais de locomoção, toma proporções esmagadoras. É necessário ter cuidado redobrado com a higiene, pois muitas síndromes afetam a imunidade das crianças. Do mesmo modo, é preciso garantir sua segurança e estar apto a reagir em casos de necessidade, como uma convulsão, por exemplo. Algumas crianças não toleram contato físico (como as que possuem espectro autista), por isso é imprescindível estar atento às orientações dos pais.

Não só crianças, mas jovens especiais, como Tainá, que sofre de autismo com cardiopatia grave, são fotografados por Eduardo

“É importante ser humilde, prestar muita atenção e conversar de forma aberta e clara. Se tiver dúvidas, sempre pergunte e saiba como perguntar ou como chegar ao assunto que você quer. Às vezes, por você ser um fotógrafo de crianças especiais, eles podem achar que você sabe tudo, por isso tenho um questionário que preencho durante a reunião e anoto detalhes que os pais informam. Você pode ler o quando for sobre o assunto, mas os pais normalmente sabem mais que os próprios médicos quando o assunto é o filho deles, pois convivem com ele no dia a dia”, explica o catarinense.

Outra evidente barreira é o preconceito. Especialmente quando se trata de incentivar o uso de imagens de crianças ou jovens especiais para fins publicitários. Eduardo percebe que muitas empresas têm medo que suas marcas fiquem vinculadas a algum tipo de deficiência. Por outro lado, há avanços: “A empresa de telecomunicações Oi já usou uma criança com Síndrome de Down para uma parte de seu comercial e ficou lindo!”, lembra. Mérito que pode ser creditado a iniciativas como o Special Kids, e a seus fotógrafos especiais.

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