Dica de moda: comece pelo “começo”

O carioca Andre Arthur, 29 anos, tem uma reação muito peculiar toda vez que encontra uma foto incrível: ele sente uma espécie de calafrio. É assim desde quando era garoto: “É meu termômetro para quando eu vejo uma foto que tem realmente algo a mais”. Andre trocou o Rio por São Paulo faz seis anos, e nesse tempo tem se dedicado a fotografar moda. Para ele, a única forma de fotografia capaz de criar mundos de fantasia.

Formado em publicidade pela ESPM, largou a profissão depois de passar um mês na Europa – só ele e uma velha Minolta. Começou clicando os lugares, mas logo percebeu que eram as pessoas que interessavam. Ao voltar ao Brasil, estava “fisgado”.

“Comecei então a fazer alguns catálogos e editoriais no Rio, mesmo enquanto trabalhava em agências. Cheguei a faltar semanas inteiras de trabalho para fotografar catálogos na praia! Foi quando eu percebi que não dava mais para manter as duas coisas e tinha que escolher. Além disso, eu sentia que faltava uma boa dose de técnica na minha fotografia. Então resolvi começar do início, como assistente”.

Assim, ele se demitiu da agência e embarcou para Sampa – “sem contatos, indicações, nada”. Depois de bater em algumas portas e ligar para um monte de gente, conseguiu emprego com Rogério Mesquita, na época responsável pela maioria das capas da Elle. “Troquei um bom salário para ser assistente fixo e não ganhar praticamente nada. Mas foi a melhor decisão da minha vida”, confessa.

Andre Arthur trocou o salário pelo emprego de assistente: “Foi a melhor decisão da minha vida”

Um tempo depois, virou assistente freelancer e trabalhou com vários fotógrafos. “Tive o prazer de trabalhar com o suíço Hans Feurer, que já fez o Calendário Pirelli, e com o francês Christophe Rihet. No Brasil, trabalhei com Gui Paganini, Miro, Gustavo Zylberstajn, Ioram Finguerman e uma dúzia de outros nomes. Foi bem legal! Aprimorei a técnica e vi coisas incríveis. Hoje em dia tenho meus clientes fixos, mas estou galgando aos poucos meu espaço, como um jovem fotógrafo”.

Jovem, porém com uma percepção clara do mercado: tem muito a crescer, mas essa condição está atrelada à evolução cultural do país. “Talvez, se nossas escolas e universidades melhorarem agora, daqui a 20 anos tenhamos um mercado com um olhar mais crítico”.

Outro fator importante, aponta, é a criação de uma identidade visual própria, divorciada do que Europa e Estados Unidos vêm fazendo: “É algo difícil, mas acho que, com o tempo, vamos conseguir. Isso está acontecendo na Ásia, no Japão principalmente, e espero que daqui a alguns anos aconteça no nosso país”.

Por ora, o mercado reserva uma única certeza: a concorrência é acirrada. Muita gente opta pela moda antevendo maior liberdade criativa que na publicidade, ou mesmo sonhando com o glamour que a rodeia.  “Outras porque simplesmente não gostam de foto de still e acabam indo para o lado de foto de gente. Mas a fotografia de moda, à primeira vista, parece simples, só que não é. Pelo contrário, às vezes você ter um layout para um anúncio e ter que reproduzir aquilo em uma foto é muito mais simples do que tirar da cartola uma ideia de um belo editorial”.

Aliás, criatividade é o maior requisito para atuar na área, considera Andre. O item número dois é pesquisar, buscar referências em todos os lugares, acompanhar o trabalho não apenas de fotógrafos conhecidos, assistir a muitos filmes, apreciar pinturas e esculturas – “ler muito também, porque isso ajuda a oxigenar a criatividade”, emenda o fotógrafo, que acredita nos benefícios de se fotografar todo dia como exercício para azeitar a técnica. “Eu carrego uma boa Olympus, que vai comigo para todo o lado, enquanto deixo a Canon na mochila esperando o próximo job. Mas isso pode ser feito até com um celular. A prática de fazer um clique todo dia é melhor que qualquer teoria”.

Falando em prática, para ele não há melhor forma de ingressar no mercado do que como assistente de fotografia, “porque você está vendo na real como é um dia de foto. Além de também aprender coisas que vão além da fotografia, como gestão de clientes, gestão de orçamento e, claro, fazer contatos no meio”.

É importante também lembrar que esse segmento envolve muita gente, profissionais cuja especialidade (e ego) o fotógrafo precisa gerir, pois ele é o “capitão do navio”, segundo Andre Arthur: “Você é quem dá o rumo para onde tudo vai se direcionar. É você quem manda. Mas, ao mesmo tempo, tem que saber lidar com seus companheiros, para não correr o risco de sofrer um ‘motim’. Por isso, respeito é a minha palavra de ordem. Se você respeita, você será respeitado. Se você sabe ouvir, também será ouvido”.

Montar uma equipe de trabalho afinada e ter planejamento é, portanto, fundamental: “Se for possível fazer um ‘pré-light’, faça. Se for possível conhecer a locação um dia antes, conheça. Você fica mais sereno, confiante e as coisas dão certo. Por ter trabalhado um tempo como assistente, eu prezo muito esses ‘escudeiros’. E não penso duas vezes quando vou para um trabalho em chamar pelo menos dois assistentes para me acompanhar. Assim você se preocupa com o que é mais importante, que é a foto, e não vai esquentar a cabeça se o gerador parou de funcionar ou se as fotos foram descarregadas no computador”.

Andre prefere trabalhar em externas ou locações. Por isso, não sente falta de estúdio. Quando isso acontece, aluga um. “Conheço grandes fotógrafos que não têm estúdio ou tiveram, mas hoje preferem ter um escritório. Alguns têm estúdio, mas, para aliviar, alugam para outros fotógrafos. A verdade é que um estúdio é um gasto mensal que pode ser perigoso, ainda mais para quem é freelancer, como a maioria dos fotógrafos. E um espaço pequeno demais, sem tantos custos, não te permite fazer trabalhos maiores. Hoje em dia, para um fotógrafo de moda, ter um escritório em algum local bacana onde você possa receber seus clientes já é o suficiente”.

Mas não é só moda que Andre respira. Para dar um tempo, de vez em quando ele encampa algum projeto pessoal. Algumas ideias nem saíram do papel, outras estão caminhando. No futuro, talvez virem exposição. Mas isso não é o mais importante: “Como eu disse antes, comigo está sempre uma câmera. Esqueço a carteira, mas não esqueço a pequena câmera que vai comigo em todo lugar. Isso me permite fotografar o que e quando eu quiser. Daí para virar um projeto pessoal, já é um passo grande”.

Cada vez mais envolvido com o vídeo (“é uma área bacana, que ainda tem espaço para crescer, principalmente na moda”), Andre planeja filmar um curta. “É um trabalho de muitas mentes em conjunto e não só a minha. Mas é algo que venho namorando faz um tempo e acho que esse ano é um bom momento para isso acontecer. Se tudo correr conforme planejado, começamos a filmar em outubro. Vamos ver o que acontece”.

E, para fechar seu pequeno receituário, o carioca indica ao aspirante doses de paciência e humildade. “É essencial. Eu, pelo menos, nunca estou satisfeito com meu trabalho. Sempre acho algo que tem que ser melhorado no próximo. Isso não significa se achar um fotógrafo medíocre. Significa que você sempre está procurando dar o seu melhor. E essa busca é infinita, já que nunca saberemos tudo e sempre vai ter algo de novo para ver”.

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