Marca d’água na foto: protege ou atrapalha?

Foto de Pedro Nossol, com a assinatura na borda: “Me chateia ver as fotos por aí sem a marca d’água”

Foi necessária uma longa negociação – traduzida em diversos e-mails enviados e recebidos – até que Pedro Nossol concordasse em permitir que o Photo Channel publicasse alguns de seus trabalhos de “sensual fitness” sem a sua assinatura impressa na lateral da imagem. “Afinal, as fotos são minhas e me chateia muito vê-las por aí sem a marca d’água. Sei que vai informar os créditos no seu site, mas quem copiar as fotos não terá os mesmos escrúpulos”, justificou o fotógrafo catarinense, radicado em Curitiba (PR).

Nossol não é o primeiro a relutar em divulgar imagens em meio eletrônico sem uma marca d’água ou assinatura inserida na fotografia. Tem sido cada vez mais comum seus colegas manifestarem a mesma preocupação diante da frequente ocorrência de pirataria virtual: pessoas que publicam imagens de terceiros como sendo suas, que as divulgam sem autorização ou sem créditos, ou que as utilizam para fins comerciais de forma indevida.

Algumas vezes, a negociação entre este site e o fotógrafo de que trata alguma matéria embarra na irredutibilidade de ambas as partes: de um lado, o profissional que refuta liberar imagens sem marcas d’água; de outro, o Photo Channel, com sua política de não publicar imagens com assinaturas, por considerá-las, antes de tudo, esteticamente prejudiciais à própria imagem. Por exemplo, Pedro Nossol voltou atrás e pediu que a matéria fosse retirada do site.

Porém, a pergunta que fica é: inserir uma marca na fotografia de fato a protege contra mau uso? Diante das facilidades dos programas de edição de imagem, que num par de cliques permitem remover partes da imagem com perfeição, não seria esse um expediente inócuo? Em geral, para não prejudicar a leitura da obra, a assinatura ou marca d’água precisa ser colocada em um local isento de informação visual, mais comumente nas bordas da foto, onde pode ser facilmente “cropada”. Por outro lado, tem a questão do marketing: a marca ajuda a divulgar o trabalho do profissional?

Trabalho de Cintia Zucchi, que dispensa marcas d’água: “Acho horrível”

Marcelo Pretto, fotógrafo paulistano de moda e publicidade, advogado especializado em direitos autorais e colunista deste site, resolveu levar essa discussão para o grupo que mantém no Facebook, o Direito na Fotografia. Marcelo perguntou: marca d’água é necessária? “Estraga” a foto? Protege o fotógrafo? Sua utilização gera retorno comercial?

Para a fotógrafa de Porto Alegre (RS) Cintia Zucchi, todas as respostas cabem numa frase: “Acho horrível”. Cintia foi uma das participantes do grupo a entrar no assunto e disse depois ao Photo Channel que inclusive já sofreu pirataria. Uma foto sua foi parar em um site de pornografia (“e a imagem não era sexual nem erótica”, afirma) e a outra em um de arquitetura europeu. A gaúcha descobriu as imagens rastreando no Google as informações de metadados que costuma aplicar pelo Photoshop. Entrou em contato com os sites e solicitou a remoção. Como até esses dados podem ser retirados da imagem, Cintia está pesquisando sobre criptografia. Porém, não acredita que isso seja o fim da história: “Ninguém lê contratos de redes sociais e o Flickr, por exemplo, tem vários ‘parceiros’. Esses parceiros utilizam a imagem, você entra no site do cara, vê sua foto, clica nela e daí volta para o seu perfil. Enfim…”, resigna-se.

Fotógrafa social e de família em São Paulo, Tatiana Colla aplica marcas d’água nas fotos para divulgar seu nome. Mas não gosta muito do resultado estético desse expediente: “Acho que estraga, e muito, a imagem, ainda mais quando há desenhos de logos inseridos”. Sua opinião é a mesma da também paulistana Giovanna Paschoalino, uma historiadora entusiasta da fotografia que classifica o uso como poluição visual: “É como corromper o próprio trabalho”, opina.

Tatiana usa marcas para divulgar o trabalho, mas não gosta muito do resultado: “Estraga a imagem”

Gabriela Castro, fotógrafa social em Vitória (ES), acredita que, para fins de divulgação, pode ser válido. Mas ressalva que tem que ser bem utilizada: “Vejo algumas fotos com marcas d’água gigantescas e que atrapalham a visualização da imagem – nesse caso, acho que mais atrapalha do que tudo. Mas já vi marcas d’água sendo utilizadas de maneira mais discreta, no canto da imagem, sem figuras e com um tamanho pequeno. Utilizadas assim, não me atrapalham”.

Sobre o “fator de proteção” que a medida proporciona, Lúcio Penteado, fotógrafo de casamentos natural de São José do Rio Preto (SP), considera baixo, em função da facilidade com que pode ser removida. “Inclusive, conheço fotógrafos que tiveram suas fotos alteradas pelos clientes ou amigos destes e a assinatura foi mantida. O problema é que a foto ficou muito ruim. Seria melhor ter tirado a assinatura”, testemunha o paulista, que marca suas fotos, porém sem verificar um retorno comercial mensurável. “Mas já usei a assinatura em fotos para conhecer mais do trabalho do autor daquela foto. Eu uso assinatura nas fotos que divulgo tanto no meu site como nas redes sociais. Se alguém gostar e compartilhar, não precisará fazer nada para manter os créditos e meu nome irá junto. Pode ser uma publicidade. Se a pessoa estiver mal-intencionada, não adianta assinatura alguma”, acredita.

Lúcio Penteado assina suas fotos para divulgar: “Se alguém gostar e compartilhar, meu nome irá junto”
Marcelo Pretto: marcas d´água são como cacos de vidro em cima do muro

O capixaba Gustavo Carneiro de Oliveira é advogado e fotógrafo em início de carreira e já escreveu um artigo sobre o tema, no qual considerou a marca d’água ineficaz contra mau uso e sugerindo a publicação em sites, por exemplo, como forma de garantir a autoria. Fazendo uma revisão do texto, Gustavo, que atualmente mora em Nova Iguaçu (RJ), pensa que a publicação pode ser uma “faca de dois gumes”: “Quando falamos de direitos, precisamos ter em mente dois momentos: antes e depois de sua violação. E ao falar em garantia, temos a garantia de que aquele direito não será violado, ou seja, o status quo de ‘pré-violação’ fica assegurado; e a garantia de que, depois de ter sido violado, aquele direito poderá ser resgatado”, explica, acrescentando que a publicação pode auxiliar no segundo momento, quando houver violação com “identificação do causador do dano”.

“Para mim, o autor de um direito deve se cercar de todas as formas: manter em seu acervo os arquivos originais inalterados, utilizar marca d’água se quiser, registrar suas imagens, publicá-las, registrar data e hora de publicação etc. Ainda assim, não terá garantia de que sua autoria será preservada”, avalia Gustavo. Sendo assim, cumpre ao autor, tendo identificado algum abuso, recorrer à lei. E nesse aspecto, salienta Marcelo Pretto, a lei o ampara, tenha uma marca impressa na imagem ou não.

O advogado cita o artigo 18 da Lei de Direitos Autorais (9.610/98) para embasar sua tese. Em texto que escreveu para o Photo Channel sobre o assunto (leia aqui), Marcelo compara as marcas d’água aos cacos de vidro que algumas pessoas inserem no alto dos muros para impedir a entrada de ladrões. Tanto do ponto de vista estético quanto de proteção, o efeito é similar: “A marca d’água estraga a beleza de uma fotografia, não gera retorno de pretensos clientes e é ineficaz quanto ao uso indevido. Caso o fotógrafo que não utilizou tal marca em uma foto tenha seus direitos violados, este gozará da mesma proteção legal que aquele que a utilizou”, conclui.

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7 Comentários

  1. Durante muito tempo me recusei a publicar fotos sem a marca d’agua. Há algum tempo, abri mão. Acho que polui a imagem e trata-se muito mais do ego e da necessidade que as pessoas têm de assumir a autoria das coisas.

  2. Não tendo nada a ver com fotografia, o que fazer quando um cliente usa uma imagem encomendada sem a pagar, nomeadamente em design gráfico? Deve-se usar ou não a marca d’agua nas propostas, maquetes, imagem final aprovada?
    Que tal entregar-se as imagens sem marca apenas quando o cliente paga a totalidade do trabalho?

  3. Eu não gosto de apreciar uma fotografia com marca d’água, por isso, as minhas fotos, mesmo aquelas que eu publico na web, estão sempre “limpas”.

    Mas, eu entendo quando um profissional investe em equipamentos e cursos e, a fotografia é seu ganha pão. Nada mais justo que tentar proteger seu trabalho dos “copiões” da internet.

  4. Pessoal. Tem que dar uma olhada sobre direitos autorais: http://www.abrafoto.org . Acho que a marca d’água pode ser alguma coisa a mais, mas não abra mão dos créditos e nunca deixe de colocar os metadados com seus dados na própria fotografia, o Lightroom é um dos programas que faz isso automaticamente. Se alguém estiver usando suas fotos na internet indevidamente, quando você colocar no Google, ele vai localizar sua fotos pelo metadados e você pode entrar com um processo contra a empresa ou pessoa que estiver utilizando suas imagens sem um contrato ou permissão. É claro que em tudo vale o bom senso, uma conversa antes, um pedido de retirada, etc. Valeu.

  5. de vez em quando eu tenho o trabalho usado por outro fotógrafo em websites, facebook e até em cartões de visita. fico sabendo por outros fotógrafos que conhecem o meu trabalho, meu conceito e o meu estilo, nunca coloquei marca d’água no meu trabalho e mesmo assim meu trabalho é identificado como meu, o que quero dizer que a marcar do fotógrafo esta na luz que ele usa, na direção e olhar. Abs