Fotografar em local público pode?

Foto: Alcides Mafra
Estátua em rua de Buenos Aires: obras permanentes em logradouros podem ser fotografadas (foto: Alcides Mafra)

O texto de hoje visa quebrar mais um mito que se espalha em fóruns fotográficos e nas mídias sociais e está relacionado com o que chamo de “direito de fotografar”. Ou seja, o que podemos ou não fazer em local público, o que a lei permite, o que as “autoridades” estão sabendo ou não (normalmente desinformadas quanto à fotografia), onde posso fotografar, e por aí segue.

Bom, falaremos hoje sobre “local público”.

Costuma-se dizer que uma pessoa, estando em local público, pode ser fotografada livremente–  ou alguma obra, estando em local público, também. Mas não é bem assim. Para esclarecer, precisamos analisar o que diz o artigo da Lei de Direitos Autorais (LDA – 9.618/98) que trata de local público. Vejamos:

Art. 48 – As obras situadas permanentemente em logradouros públicos podem ser representadas livremente, por meio de pinturas, desenhos, fotografias e procedimentos audiovisuais.

E aí surgem duas dúvidas:

1) Quais obras estão situadas permanentemente?

2) O que é logradouro público?

Vamos lá:

1) As obras de que trata o artigo são todas aquelas protegidas pela LDA em seu art. 7o, portanto engloba: fachadas de prédios, esculturas, pinturas etc., desde que estejam de forma permanente no “logradouro público”.

2) Logradouro são todos os lugares públicos, reconhecidos por um município, como ruas, avenidas, praças. São lugares de livre acesso ao público. Ou seja, uma rua reconhecida pela prefeitura de sua cidade (com endereço) é um logradouro.

É o que define o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa: logradouro (logrado, particípio de lograr + -ouro) s. m. 1. Coisa usufruída ou gozada. 2. Terreno ou espaço anexo a uma habitação, usado para serventia ou com outras funcionalidades. 3. Espaço público comum que pode ser usufruído por toda a população. 4. Campo de pastagem comum ou público.

Portanto, parque não é logradouro, e sim bem/patrimônio do poder público. No caso específico do Parque do Ibirapuera, é patrimônio da Prefeitura Municipal de São Paulo. Outro exemplo é o Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (Petar), que pertence ao Estado de São Paulo, assim como o Xingu é da União Federal, ou República Federativa do Brasil.

Então, exemplificando:

a) O obelisco que está num logradouro público, em frente e fora do Parque do Ibirapuera, pode ser representado livremente por fotografias, sem que haja necessidade de autorização de seu autor (escultor), pois ele está ali de forma permanente.

b) Outro exemplo é imaginarmos uma exposição de esculturas no mesmo logradouro, porém será uma exposição temporária, ou seja, acabando o prazo, todas as obras do acervo exposto serão recolhidas. Nesse caso, por incrível que pareça, para que o fotógrafo as fotografe com intuito de adquirir os direitos autorais sobre tais fotografias, deverá sim pedir autorização do autor das referidas esculturas.

Ora, você e eu, com certeza, estamos fazendo a mesma pergunta: por quê? Simplesmente porque o legislador assim definiu. É o “espírito da lei” ou a “mens legis” (é o significado atribuído ao texto jurídico, no sentido de que ele se configura um produto autônomo do legislador, com suas intenções aplicadas na lei). Ou seja, a lei assim o quer. O legislador visa aqui uma proteção maior às obras temporariamente expostas àquelas que estão no logradouro de forma permanente.

Como diz o brocardo jurídico, “dura Lex, sed Lex”: a lei é dura, mas é a lei! Obrigado a todos os colaboradores e comentários sobre os temas abordados neste espaço.

  • MARCELO PRETTO é fotógrafo de moda, retrato e publicidade musical, com trabalhos internacionais realizados no decorrer de sua carreira, professor de fotografia e advogado atuante em São Paulo. Especialista em direitos autorais pela FGV e consultor jurídico a colegas fotógrafos, desenvolveu o módulo “Direitos autorais, direito de imagem e direito de fotografar”, com artigos publicados em revistas sobre o tema.

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14 Comentários

  1. Tenho a mesma dúvida do Luiz. Tenho fotografias com pessoas em ambientes públicos e não sei se posso usá-las para concorrer em concurso fotográfico ou para publicação de algum tipo.

  2. Gente!! Perdão na demora da resposta!! Quando envolverem pessoas, devemos ter o maior cuidado… O ideal é sempre termos a autorização do fotografado, mas caso seja impossível, devemos nos preocupar com a composição da foto, ou seja, pura linguagem fotográfica. Isto é, a pessoa fotografada deve fazer parte integrante da realidade coletiva e não estar individualizada. Para isso cabe a nós escolhermos a melhor objetiva, trabalhar uma profundidade de campo ampla e não colocar alguém como assunto principal no enquadramento. Esse assunto na verdade vai mais além, porém estou terminando o texto e logo postarei aqui!! Abraços a todos!!

  3. Marcelo, minha área é um pouco diferente, mas com o mesmo principio. Eu sou ilustrador e faço retratos realistas. Tenho uma dúvida parecida, com sutis diferenças: Se eu desenhar uma pessoa, colocando-a como elemento principal do retrato(em local público), porém, usar essa imagem/desenho sem nenhum fim lucrativo, apenas para divulgar minha arte, ou seja, mídias online e talvez algum impresso, mas no caso do impresso, cobrando apenas o valor da impressão, por exemplo, mesmo assim ainda posso ter problemas?

    1. Opa, eu que agradeço pela ajuda, não se preocupe com a demora!
      Então, o trabalho seria, basicamente, uma série de desenhos de pessoas, que eu faria na rua. Seriam retratos, então pessoas específicas ficariam como elemento principal nos desenhos. Eu usaria pra divulgar meu trabalho de ilustrador, mas seria sem fins lucrativos, com a obra em si, no caso(então acho que se encaixa em portfolio mesmo). Eu iria divulgar os desenhos pela internet e talvez dar a opção de um número limitado de pessoas adquirem uma versão impressa dos desenhos e nesse caso eu cobraria só o valor da impressão(sem nenhuma margem de lucro pra mim). Resumindo, a intenção com esses desenhos não é comercial, mas eles servirão pra chamar a atenção pra outros trabalhos, que aí sim serão comerciais e tem também a questão de eu disponibilizar versões impressas. Daí surgiu a dúvida com os problemas que posso ter com os direitos de imagem.

  4. no caso um shopping seria área privativa?? ou publico no caso, quais seriam as regras de se fotografar por exemplo uma loja ou um corredor do shopping?

  5. Se fachadas de prédios podem ser fotografadas por estarem situadas permanentemente em logradouros públicos, qual seria a diferença então para fachadas de casas ou jardins que, mesmo estando em logradouros públicos, sim precisam de autorização de propriedade?

    Obrigado !

  6. Se eu fotografasse uma pessoa em uma parque eu teria de pegar a permissão dela para esta fotografia e a autorização do parque também?

  7. então quer dizer que os paparazzos pegam autorização de todos os fotografados mesmo estando em local público?Não entendi bem isso. Pra mim qualquer um pode ser fotografado em local público sem necessidade de autorização, não é?

  8. Não sou fotografa profissional, mas adoro fazer registros de aves, deixando claro que o foco das minhas fotos são as aves eventualmente aparece o galho em que a mesma esta repousada, recentemente fui barrada em uma área verde (parque) dentro de São Paulo e embora não havia nenhum aviso sobre a proibição, fui informada de que eu não poderia fazer estas fotos ali sem autorização. Me deram uma explicação sem muito sentido e ainda tenho dúvidas quanto a essa proibição. Alguém poderia me esclarecer?

  9. Uma coisa eu gostaria de assinalar. Muitas lojas que vendem máquinas fotográficas usam o termo
    “Semi-“, mal-intencionado,para enganar o comprador. A ideia é passar para os compradores que a máquina que ele está adquirindo, por volta de 2.200,00 é semi-profissional, isto é, semelhante a uma profissional que custa por volta de 30.000,00 reais ou mias e se contar uma lente profissional a mais que custa por volta de 15.000,00 reais, então vejamos, para que eu gastaria 45.00.00 mil numa máquina se posso comprar uma “semelhante” por 2.200,00 ou menos…Pura enganação e é aí que as coisa se complicam porque as pessoas que nos abordam tem a seguinte ideia. máquina preta e grande é profissional, não permita que se fotografem com elas…e não é assim pois eles não tem nenhuma orientação quanto ao que é profissional ou não, mesmo porque eu poderia vender imagens de locais públicos, isso claro, é uma hipótese, tiradas com meu com meu celular…e guardar minha máquina profissional ou “semi-“. É notável que as pessoas que nos abordam não são orientadas quanto ao tipo de máquinas. Hoje é comum ver pessoas usando DSLR, também conhecidas como semi…