Há quatro anos que Nilo Lima, 29 anos de idade, vive com um pé no Brasil e outro na Espanha. Fotógrafo de casamentos, o mineiro de Viçosa reconhece a dificuldade da rotina, mas não reclama. Pelo contrário: “Gosto do que estou vivendo”, afirma o profissional, que tem oito anos de experiência e arrisca alguns cliques na área de moda.
Mais difícil do que se equilibrar entre dois países tão diferentes foi emplacar o nome em solo espanhol. “Não são como nós, brasileiros, que achamos que tudo o que vem de fora é melhor”, cutuca Nilo, que, no entanto, já se sente em casa fotografando no país das touradas. Mas sem perder o jeito brasileiro de enxergar as emoções à beira do altar. Na entrevista que segue, ele fala da carreira e da sua vivência internacional. Acompanhe:
Você começou a fotografar durante seu curso de zootecnia. Acabou que a fotografia desviou você do seu caminho profissional ou chegou a exercer a profissão? Sim, iniciei no mundo da fotografia ainda durante a minha graduação em zootecnia pela Universidade Federal de Viçosa, nas disciplinas de fotojornalismo e fotografia do curso de comunicação social, disciplinas que, para o meu curso de zootecnia, eram facultativas. Eu não diria que a fotografia tenha me desviado do meu caminho profissional; eu encontrei o meu caminho na fotografia. Trabalhei por um tempo na Nova Zelândia e em Araponga (MG) como zootecnista, foi uma experiência muito positiva, porém a paixão que me move vem mesmo da fotografia. É alucinante enquanto fotografo.
E quando foi que você percebeu que o seu negócio mesmo eram as imagens? Sempre gostei de imagens. Quando ainda muito pequeno, desenhava muito. Na adolescência, fiz pintura por alguns anos e a fotografia foi uma adorável consequência. Meu pai e avó são artistas natos (porém na área musical), acho que está no sangue essa sensibilidade para a arte e foi amor ao primeiro clique.
O casamento foi a sua primeira opção? Como foi se desenvolvendo a sua carreira? Meu primeiro trabalho, ainda como aluno do curso de fotojornalismo na UFV, foi com fotografia de moda. Em seguida, realizei alguns outros trabalhos mais, porém poucos em relação ao que realmente acho que seja necessário para assumir a responsabilidade de um casamento como primeiro fotógrafo. Primeiro e único fotógrafo, na verdade, pois fui sozinho e trabalhei sozinho em casamentos por muitos anos, o que hoje não recomendo. Tudo aconteceu ainda no casamento da minha irmã. Quando a vi entrando vestida de noiva tive uma vontade tremenda de estar no lugar do fotógrafo, registrando tudo. Porém, não havia comprado ainda minha câmera e estava no início do curso de fotojornalismo. Mas foi muito rápido esse primeiro contato com casamentos. Acredito que, logo após fazer três ou quatro trabalhos como fotógrafo, já fechei o primeiro contrato de casamento. E foi espetacular. Uma adrenalina que não sinto em nada na minha vida. E isso me instiga cada dia mais a buscar pelo inusitado durante as cerimônias. Fazer fotos criativas e diferentes em casamentos hoje, depois de oito anos de experiência na área, é muito difícil, porém é o que busco sempre e a cada cerimônia.
Você morou um tempo na Nova Zelândia. Como foi essa experiência e de que maneira ela influenciou (assumindo que tenha influenciado) o seu olhar fotográfico? Morar na Nova Zelândia foi outra experiência ímpar na minha vida. Morei lá por quase um ano e foi onde tive milhares de grandes oportunidades e grandes experiências. Entre elas, a minha primeira experiência como zootecnista e também de conhecer fotógrafos do mundo inteiro. Conhecer outros profissionais de países tão diferentes como fotógrafos alemães, canadenses, australianos… e, claro, do próprio país. Isso abriu a minha mente fotográfica, deu um giro de 360º no meu modo de ver a fotografia e possibilitou ampliar e afiar o meu olhar, treinar minha composição, aprender novas técnicas e harmonizar minhas fotos.
E qual o motivo de ter ido morar na Espanha? Como foi para se adaptar ao novo país, especialmente, como foi para se estabelecer como fotógrafo por lá? A primeira vez que pensei na Espanha foi pelo idioma, aprender o castelhano. Mas vir realmente para a Espanha foi por ter aprovado aqui, na Universidade de Valladolid, onde atualmente vivo, o meu mestrado. E ainda durante o mestrado tentei fazer novos contatos fotográficos, mas não tive nenhum sucesso. Todas as portas que bati foram fechadas. E nesse primeiro contato o que queria mesmo era apenas conhecer um casamento espanhol, como atuam e nada mais. Cheguei a pensar que meu trabalho não era bom, fiquei bastante triste. Mas, aos poucos, fui conhecendo os trabalhos espanhóis e, claro, a comparação foi inevitável. E foi daí que surgiu a ideia de criar meu primeiro projeto fotográfico, para poder trazer novas ideias e oferecer outras perspectivas para o profissional espanhol. Mostrar como trabalho e como funciona toda a minha filosofia de trabalho em um casamento com uma visão brasileira de atuar. Montei então um workshop, que se chama “Fotojornalismo de casamento de A a Z”, e foi aqui, na Espanha, que lancei esse workshop e foi um sucesso. Esgotaram todas as vagas e fiz contatos espetaculares com esse curso, o que abriu as minhas portas no país e me fez conhecer grandes e bons amigos, que levarei para sempre no coração.
Atualmente, seu trabalho está mais forte aqui ou aí? Seus planos são de continuar entre os dois países ou pretende futuramente se estabelecer em um só? No Brasil tenho oito anos de atuação como fotógrafo. Isso ajuda muito a fortalecer o nome no mercado. Claro que não é tudo, já que quem não se atualiza e busca inovar sai mesmo da área. E isso é o que mais faço: estudo muito, procuro por cursos no mundo inteiro e me envolvo com tudo que posso para não perder a conexão do que está acontecendo no mundo fotográfico. Gosto do que estou vivendo, consegui me organizar. Uni o amor por viajar e a paixão pela fotografia. E morar fora te permite ver coisas que você não irá ver nunca enquanto estiver estagnado e parado na mesmice. É cansativo, confesso. Porém, satisfatório demais e muito prazeroso. Me permite conhecer pessoas que somam demais na minha carreira, me permite ver e viver coisas que, acredito, estando apenas no Brasil, não aconteceriam. Tenho que aproveitar enquanto ainda sou jovem e tenho saúde para me aventurar. Por quanto tempo mais isso irá durar, não saberia responder no momento. Há quatro anos que estou entre Brasil e Espanha. Acabei de retornar da minha temporada pelo Brasil e estou com a agenda aberta para os casamentos e cursos pela Espanha para o segundo semestre de 2014. Isso é o que sei até o momento. Quem sabe um novo país para 2015?
Falando de casamentos, existem diferenças significativas entre a fotografia como é feita aqui e na Espanha? Poderia citar algumas? Há diferenças na dinâmica da cerimônia? A metodologia de trabalho é basicamente igual. Os profissionais espanhóis atuam de maneira bem parecida com a nossa em um casamento, também fazem a cobertura completa, desde acompanhar a noiva e o noivo a se arrumarem, registrando os detalhes da produção, make, cabelo, vestido e acessórios, até a festa. O que mais gosto na Espanha e que é muito diferente dos casamentos brasileiros, é que 98% são realizados durante o dia. Ou acontecem de manhã e logo é servido um almoço, ou à tarde. Isso valoriza muito o nosso trabalho, pois trabalhar com a luz de Deus não tem preço. Nas cerimônias, em geral, o que diferencia do Brasil é apenas que a noiva entra com o padrinho do casamento e o noivo com a madrinha. Não existe aquela procissão de padrinhos antes da entrada da noiva como em muitos casamentos brasileiros… Além disso, existe um momento, que é a entrega das “arras”. As “arras” são treze moedas de ouro ou prata que, enquanto o celebrante faz um voto, são entregues do noivo para a noiva e vice-versa. Antigamente, eram entregues apenas do noivo para a noiva, simbolizando a entrega da sua fortuna em caso de descumprimento do matrimônio.
Imagino que, do ponto de vista cultural, haja diferenças. Isso em algum momento o colocou em uma situação embaraçosa, fotografando casamentos? Tem alguma história curiosa para relatar? Sim, as diferenças realmente existem e são muitas. Mas tento sempre entender e aprender um pouco de tudo antes de ir para um casamento. Seja na entrevista que faço com o casal, ou na reunião que faço com o padre, pastor, celebrantes… A situação que me deixou um pouco sem graça, mas feliz, foi em um dos meus primeiros casamentos na Espanha. Durante o jantar, de uma das mesas de amigos do casal começaram a gritar meu nome e a balançar um lenço branco. Levantar e balançar um lenço branco na Espanha é uma tradição que vem das touradas, isso acontece quando o toureiro tem um bom desempenho e toureia bem. Me pegaram de surpresa quando fizeram isso, não esperava, já que procuro estar o mais discreto no evento. Uso roupas sempre de cores escuras para não chamar a atenção e me camuflar. Porém, os amigos dos noivos, quando viram a sessão de pré-casamento do casal, ficaram apaixonados pela minha fotografia e foi esse o motivo do lencinho branco, que jamais esquecerei.
E como os espanhóis veem o seu trabalho? O olhar de um brasileiro é valorizado aí? Que conselhos você daria para alguém que pensa em seguir esse caminho, ir fotografar na Espanha, na Europa? Os espanhóis não são como nós, brasileiros, que achamos que tudo que vem de fora é melhor. Foi muito difícil minha entrada e aceitação no mercado. Mas atualmente uso isso, sou diferente aqui, por ser estrangeiro e pelo meu olhar seletivo sou eu que coloco meu preço e cobro o que acho justo. E isso é mais alto que o geral por aqui. Conheço bem o que faço e sei o que invisto para oferecer um trabalho de qualidade. Fotografia não é barato e todos sabem disso. Viajar para estudar, fazer novos cursos, congressos, comprar equipamentos, manter site, blog, publicidades são investimentos que o cliente não vê e devem ser colocados no seu orçamento, pois isso é um investimento alto para oferecer um trabalho diferenciado, único e especial.
Vir fotografar na Espanha ou Europa, quem tiver essa oportunidade deveria agarrar e fazer acontecer. É uma experiência fascinante. Te faz ver que o segredo do crescimento é se superar a cada momento. As dificuldades são enormes, porém gratificantes. Não é segredo para ninguém que a Europa está passando por uma das piores fases financeiras da História e isso deve ser levado em consideração para quem quiser vir sem maiores planos. Mesmo que financeiramente não seja tão satisfatório, como experiência de vida e fotográfica tenho certeza que será mágico. Recomendo!