Assis Horta: retratos para o povo
Hoje em dia muita gente pode até não se dar conta, em vista da facilidade com que se obtém um retrato – profissional ou não. Mas o fato é que conseguir um registro desses já foi algo muito mais difícil. Um luxo, na verdade, destinado apenas aos brasileiros mais abastados. Mas, a partir da Consolidação das Leis Trabalhistas, a classe operária do país passou a contar ao menos com uma foto para pôr no novo documento que iria dispor: a carteira profissional. O trabalho de um dos responsáveis por realizar essa tarefa é o tema da exposição Assis Horta – A democratização do retrato fotográfico através da CLT, que será inaugurada dia 2 de dezembro no Palácio do Planalto, em Brasília.
A exposição abre no dia do nascimento de D. Pedro II, primeiro brasileiro fotografado no país, e tem curadoria de Guilherme Horta. Contemplada pelo Prêmio Funart Marc Ferrez no ano passado, na categoria de Reflexão Crítica sobre Fotografia, foi apresentada de maio a junho deste ano no Centro Cultural e Turístico do Sistema Fiemg, em Ouro Preto (MG). Em Brasília, será vista até 8 de janeiro do próximo ano, com entrada gratuita.
Hoje com 95 anos de idade, Assis Horta possuiu estúdio em Diamantina (MG) e entre os anos 40 e 70 registrou praticamente toda a sociedade local. A partir da promulgação da CLT, em 1° de maio de 1943, os trabalhadores começaram a procurá-lo para obter a 3×4 que precisavam para “tirar a sua profissional”, a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS). A maioria jamais havia entrado num estúdio antes, sequer foto possuía, pois era coisa de quem tinha dinheiro. Mas muitos gostaram da experiência e voltaram, trazendo amigos e familiares. Assim, a exposição mostra não apenas fotos dos trabalhadores, mas de suas famílias.
“O retrato entra na vida do trabalhador, realiza sonhos, dignifica, atenua a saudade, eterniza esse ser humano, mostra a sua face”, destaca Guilherme Horta, que apesar do sobrenome não guarda parentesco com Assis. “Fascinante reconhecer o gene do nosso povo através de um fotógrafo com rara sensibilidade para a execução do retrato. A coleção Assis Horta com os portraits desses primeiros operários legalmente registrados é uma pérola na história brasileira”, considera o mineiro, que também é fotógrafo e impressor.
Assis Horta começou a exercer seu ofício em 1928, aos dez anos de idade. Com a morte do pai, necessitando ajudar no sustento da família de dez irmãos, começou a trabalhar no Photo Werneck, em Diamantina. Posteriormente, acabou adquirindo o estúdio.
Segundo contou em entrevista ao Estadão, de 1934 a 1967 ele fotografou de tudo: festas, procissões, quermesses, casamentos, batizados e, principalmente, fotos para a carteira de trabalho. “Meu acervo tem mais de 96 mil chapas de vidro de 9×12”, contou o fotógrafo, que atualmente faz apenas fotos dos filhos e netos. Para isso, usa uma Rolleiflex: “Esse negócio de câmera digital não tá com nada. A turma tira foto e guarda. Eu gosto do papel, que posso mostrar pra todo mundo”.
A exposição no Palácio do Planalto terá outras atrações: uma reprodução de um estúdio de época e uma vitrine onde estarão caixas de filmes antigos, envelopes de pedido de fotos de Assis Horta, retratos 3×4, carteiras de trabalho, entre outras relíquias.