A sensualidade acidental de Susi Godoy

Um aspecto que não tem sido levado muito em conta, nessa exaustiva discussão a respeito dos méritos e prejuízos da popularização da fotografia, é sobre o quanto isso permitiu às pessoas encontrarem o seu diálogo pessoal com as artes. Para além do sentido econômico, de se lançar num mercado que ainda oferece demanda, está o prazer de criar, de usar meios viáveis de comunicar aos outros o que vai no íntimo.

Susi Godoy: sensualidade não é o foco

Nisto talvez resida a grande contribuição do digital: promover uma abertura para que pessoas como Susi Godoy, 26, possam externar sua visão de mundo. Enfermeira em dias úteis, nos últimos dois anos ela tem dedicado seus finais de semana a fotografar. Natural de Amparo, no interior de São Paulo, Susi desenvolve trabalhos comerciais e autorais. Fotografa pessoas, em ambos os casos. “Minhas primeiras experiências foram fotografando a minha irmã, que é modelo alternativa, e começamos trazendo propostas novas para o mercado da região (ensaios temáticos). E, a partir disso, foram surgindo clientes e desde então nunca mais parei”, explica.

Quem vê seu trabalho, rapidamente o associa com sensualidade. “Mas não é o meu foco”, avisa. “Em alguns casos, eu procuro descaracterizar a modelo e focar apenas na expressão corporal, pra que não fale somente de beleza. E nas sensuais tenho muito cuidado em não expor demais a modelo e foco na suavidade. Eu procuro extrair a leveza que toda mulher tem de forma sutil”, afirma a paulista, que procura acrescentar algo mais à imagem, uma carga emocional: “Não deixar [a foto] falar apenas sobre beleza, e sim sobre algum tipo de sentimento também”.

Talvez por tentar fugir ao rótulo, ela vê dificuldade em dirigir ensaios em que o nu está presente. Para compensar, conversa bastante, mostra referências e sugere poses levando em conta o conforto da modelo. “A maioria das minhas referências são fotógrafos que têm a linguagem bem simples, que focam em coisas mais naturais, despretensiosas, sem apelo sexual”, acrescenta. Apesar disso, algumas imagens suas exalam sensualidade, do mesmo modo que há suavidade e um sentimento indefinido de introspecção e ausência. De todo modo, a comunicação entre fotógrafa e fotografadas tem resultado num nível de satisfação mais que aceitável para ambas as partes. Crédito também para as compatibilidades do gênero: “Acredito que, por ser mulher, seja mais fácil rolar essa sintonia”.

Susi usa sempre luz natural (“acredito que ela soma muito ao clima de cada foto”) e procura locações pela região que possam se encaixar no contexto do ensaio: ruínas, cachoeiras, casas abandonadas. “Gosto da interação com o cenário”, diz.

Como muita gente dessa nova geração de fotógrafos, Susi começou no esquema “do it yourself”. Acredita no aprendizado que cada novo ensaio oferece, mas planeja estudar mais. “Eu tenho uma câmera bem limitada e procuro explorar tudo o que ela tem antes de evoluir meu equipamento. Isso vai de fotografar tudo em Raw e fazer tudo no manual pra ter exatamente o resultado que quero. E, além do equipamento, sinto a necessidade da parte teórica, de estudar a fotografia a fundo, inclusive a analógica”, avalia.

Nada disso, porém, a impediu de publicar ensaios nas revistas VIP e Status, ou de mirar no circuito fine art. Inclusive, já vendeu alguns trabalhos. Também tem planos de expor. Um projeto seu irá para as paredes em junho, e rendeu ainda uma viagem de estudos a Paris: “Uma empresa se interessou em me patrocinar e financiar minha viagem e o curso. Em troca, eu farei um diário de viagem na minha página no Facebook, vinculando a empresa a essa oportunidade”.

Sobre a popularização da fotografia, da qual é “produto”, Susi vê os dois lados da moeda: de um, a democratização da arte (o que ela chama de “inclusão”); de outro, a banalização e a pressão sobre quem vive de tirar fotos. No entanto, adota o discurso do otimismo: “Mesmo tendo pontos negativos, agora muitas pessoas têm a chance de desenvolver seus talentos e de usar a fotografia como forma de se expressar. E, a meu ver, desde que as pessoas não se limitem apenas a ter uma câmera, tudo é valido”.

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